quinta-feira, 8 de julho de 2010

Palavras desconexas 6

A simplicidade do momento é enorme. Ouça a música. Que bela canção! Os sons mais baixos parecem sussurros. Os sons mais altos parecem trovões imponentes que rasgam os céus e nos causam apreensões.

Imagine-se. Sonhe. Recorde-se. Agradeça. Bata palmas. Pratique imobilidade e sinta a brisa. Ouça ao longe o barulho da rua. Divague os seus sentidos. Pense em tudo que houve no mundo. Sinta-se parte de um plano. Sorria. O futuro está chegando e você precisa mudar de roupa.

Que confusão agradável se forma onde há bondade, altruísmo e ânimo. O preço pouco importa. O necessário é não acreditar em certo ou errado. Os dogmas foram feitos exatamente por pessoas que acreditavam que a ordem se alcançaria pela obediência cega, mas e se elas estiverem erradas?

O impossível é temporário. O inevitável é apenas o que se deseja ardentemente. No final de tudo, quando as costas se voltam fica exatamente a vontade de ouvir mais uma vez aquelas palavras tão duras, não por elas, mas pela voz que as entoou. O maior, o menor, o mais ou o menos é só uma convenção. Temos que abraçar sem indagações mínimas de correção e ajuste. Siga os pequenos rios, eles com certeza “caminharam” para lagos, rios maiores, mares e para o nada.

Apaguem-se as velas, as comemorações acabaram de ser proibidas. A reflexão imposta exige silêncio, incensos e muitas preces. Sinta-se alegre e mudo. Neste momento as palavras são sujas, só os atos importam.

À volta para casa será mais tranquila, mas as lembranças perdurarão. O sorriso congelado na face. O desgosto diminuído dia após dia até a velhice, onde as forças abandonam, mas o coração se torna livre para todo o sempre.

A música que você ouve agora traz conformismo, a bandeira ainda esta sendo agitada. O cavalo bem escovado segue trotando feliz e você pensa que chegou o momento. A senhora te recebeu, mais tarde haverá chá e histórias.

O cheiro característico invade a tua memória. Sacudido em tuas lembranças você mergulha em décadas anteriores. Com medo das próprias reações o peito se agita. As pessoas notam a sua ansiedade, lhe indagam se está tudo bem e você sorri sem resposta, com o coração batendo furiosamente em seus ouvidos.

Eis que de repente tudo se resolve. A noite perfeitamente negra, sem luar contrasta com o palácio totalmente iluminado. O jantar será servido e mais uma vez você estará perdido em teus pensamentos.

A serenidade impera, mas os teus hormônios outra vez o traem e te impulsiona para o ridículo. As pessoas outra vez estão te olhando com cara de indagação. A tua fala sem mais nem menos é desprendida e agora soa fácil. A platéia se encanta e empolgado você começa uma recitação.

A alegria é contagiante em crescente êxtase os presentes bebem cada sílaba, cada palavra e você no centro disso tudo não sabe como acabar. Sem nunca ter assistido uma única aula de piano, você vai até ele. Solenemente as pessoas formam uma roda em sua volta e você faz a sua declamação final.

Com a voz embargada pela emoção você conta de maneira singela e simples a história de um adolescente que saindo de sua casa foi para uma luta longe de sua pátria. Vestia uniforme, tinha um fuzil na mão e nada de reflexão na cabeça.

No primeiro dia em solo desconhecido ficou muito doente por conta do frio que fazia, mas não quis faltar à primeira empreitada contra o inimigo e teve o azar de cair em uma armadilha do terreno e lá ficou. A sua participação no combate terminava ali. Sua história não teve outros capítulos, nem mesmo um epílogo, pois não se sabe se ele morreu se foi preso ou se partiu perdendo-se do grupo.

O piano acompanha a narrativa com notas que acompanham a dramaticidade do momento. Porém, antes que a cena tivesse outros atos um senhor de barba branca e uma senhora de cabelos grisalhos vão até o piano e te abraça, você permancece em transe e com os olhos fixos em alguma coisa sem importância. De repente os teus olhos se fecham. A razão não entendeu muito bem tudo que se passara. Calmamente você retorna da "viagem" olha no relógio e percebe que é hora de ir embora. Mudamente se despede com um gesto de cabeça, coloca o grosso casaco e o chapéu. Acende o charuto. Em ato contínuo vira as costas, abre a porta e saí para a madrugada gelada e convidativa de inverno.

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